📌 A Tese do Tema 506/STF e seus Reflexos no STJ
A tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 635.659/SP (Tema 506 da Repercussão Geral) representou um marco na interpretação do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), ao estabelecer que a posse de até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas deve ser presumida como destinada ao consumo pessoal. Essa presunção, no entanto, é relativa e pode ser afastada diante de indícios concretos de tráfico.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem aplicado essa diretriz com cautela, reforçando que a simples quantidade não é critério absoluto. Em diversos julgados, a Corte reconheceu a validade da presunção de uso pessoal, mas também reafirmou a possibilidade de sua superação quando presentes elementos como balança de precisão, embalagens fracionadas, registros de transações ou condutas típicas de mercancia.
No AgRg no HC 961071/SP (DJEN 26/02/2025), por exemplo, o STJ reconheceu a prevalência da presunção de uso pessoal diante da ausência de outros elementos indicativos de tráfico, mesmo com a apreensão de 36,42g de maconha. Já no AgRg no HC 990550/RO (DJEN 10/06/2025), a Corte afastou a aplicação do Tema 506 ao constatar a presença de petrechos típicos do tráfico, como balança e sacolas plásticas.
Esses julgados demonstram que o STJ tem buscado um equilíbrio entre a proteção de direitos individuais e o combate ao tráfico de drogas, exigindo fundamentação concreta para a desclassificação ou manutenção da imputação penal. A aplicação da tese do STF, portanto, não é automática, mas depende da análise minuciosa do contexto fático-probatório de cada caso.
⚖️ A Presunção Relativa de Uso Pessoal: Critérios e Limites
A presunção de que a posse de até 40 gramas de cannabis sativa configura uso pessoal, conforme fixado pelo STF no Tema 506, é um avanço importante na diferenciação entre usuário e traficante. No entanto, essa presunção é apenas relativa, o que significa que pode ser afastada com base em elementos concretos que indiquem o contrário.
O Superior Tribunal de Justiça tem reiterado que a simples quantidade da substância não é suficiente para afastar a imputação de tráfico. No AgRg no HC 990550/RO (DJEN 10/06/2025), por exemplo, mesmo com pequena quantidade de droga, a presença de balança de precisão, sacolas plásticas recortadas e uma motocicleta de origem ilícita foram considerados suficientes para manter a condenação por tráfico, afastando a aplicação do Tema 506/STF.
Por outro lado, no AgRg no HC 961071/SP (DJEN 26/02/2025), a Corte reconheceu a prevalência da presunção de uso pessoal diante da ausência de outros elementos indicativos de mercancia, mesmo com a droga dividida em 29 porções. A decisão destacou que, sem provas adicionais, não seria possível desconstituir a presunção de que o entorpecente se destinava ao consumo próprio.
Esses julgados demonstram que a análise deve ser feita caso a caso, considerando não apenas a quantidade, mas também:
- A forma de acondicionamento da droga;
- A presença de instrumentos típicos do tráfico;
- As circunstâncias da apreensão;
- O histórico do acusado;
- E outros elementos probatórios.
A relatividade da presunção impõe à autoridade policial e ao Judiciário o dever de fundamentar de forma minuciosa qualquer afastamento da tese do STF, sob pena de violação ao devido processo legal.
🚨 Quando a Pequena Quantidade Não Basta: Intuito de Mercancia e Tráfico
A tese do STF no Tema 506 estabelece uma presunção de uso pessoal para quem portar até 40g de cannabis sativa. No entanto, essa presunção não é absoluta. O Superior Tribunal de Justiça tem reiterado que, mesmo diante de quantidades reduzidas, a presença de indícios de mercancia pode justificar a imputação por tráfico de drogas.
No AgRg no HC 976090/SP (DJEN 11/06/2025), o STJ manteve a condenação por tráfico com base na apreensão de apenas 1,53g de maconha. O fundamento foi a existência de provas que indicavam a destinação da droga a terceiros, além da posse de uma arma de fogo. A Corte entendeu que, embora a quantidade fosse ínfima, o conjunto probatório evidenciava o dolo de mercancia.
De forma semelhante, no AgRg no HC 990550/RO (DJEN 10/06/2025), a presença de balança de precisão, sacolas plásticas recortadas e uma motocicleta de origem ilícita foi considerada suficiente para afastar a presunção de uso pessoal, mesmo com pequena quantidade de entorpecente. O STJ reforçou que o porte de instrumentos típicos do tráfico é indicativo de atividade ilícita organizada.
Esses precedentes demonstram que a análise da conduta não pode se limitar à quantidade da substância. O Judiciário deve avaliar o contexto da apreensão, os objetos encontrados, o comportamento do acusado e outros elementos que revelem a real finalidade da posse da droga. A pequena quantidade, por si só, não garante a aplicação automática do art. 28 da Lei de Drogas.
🧪 Instrumentos de Comercialização e a Superação da Presunção
A jurisprudência do STJ tem sido firme ao afirmar que a presunção de uso pessoal, prevista no Tema 506/STF, pode ser afastada quando há elementos objetivos que indiquem o intuito de mercancia. Entre esses elementos, destacam-se os chamados “instrumentos de comercialização”, cuja presença no local da apreensão reforça a tese de tráfico, mesmo diante de pequenas quantidades de droga.
No AgRg no HC 990550/RO, DJEN 10/06/2025, o STJ negou a aplicação do Tema 506 ao caso em que, além da droga, foram encontrados pedaços de sacolas plásticas recortadas, balança de precisão e uma motocicleta de origem ilícita. A Corte entendeu que esses objetos são típicos da atividade de tráfico e, portanto, suficientes para afastar a presunção de uso pessoal.
De forma semelhante, no AgRg no HC 976090/SP, DJEN 11/06/2025, a condenação por tráfico foi mantida mesmo com a apreensão de apenas 1,53g de maconha. O fundamento foi a presença de uma arma de fogo e a comprovação de que a droga seria entregue a terceiros, o que evidenciou o dolo de mercancia.
Esses julgados demonstram que a análise da conduta deve ir além da quantidade de entorpecente. A presença de balanças, embalagens fracionadas, registros de transações e até mesmo celulares com contatos suspeitos são indícios relevantes que, somados, podem justificar a imputação por tráfico. O STJ tem exigido que tais elementos estejam devidamente descritos e fundamentados nos autos, vedando decisões baseadas em critérios subjetivos ou meras suposições.
🚪 Busca Domiciliar e Flagrante: A Legalidade da Prova
A legalidade da entrada forçada em domicílio sem mandado judicial, especialmente em casos de flagrante por tráfico de drogas, tem sido objeto de intenso debate jurídico. O STJ, alinhado à jurisprudência do STF (Tema 280 da Repercussão Geral), tem exigido a demonstração de “fundadas razões” para legitimar a medida, sob pena de nulidade das provas obtidas (Ingresso Policial em Domicílio sem Mandado Judicial: Fundamentos, Requisitos e Jurisprudência Atual).
No AgRg no HC 988551/RJ, DJEN 10/04/2025, o STJ analisou a legalidade de uma busca domiciliar realizada com base em denúncia anônima. A Corte entendeu que a diligência foi válida, pois foi precedida de observação policial, tentativa de fuga do acusado e apreensão de drogas e materiais para endolamento. Esses elementos foram considerados suficientes para configurar situação de flagrante, legitimando o ingresso forçado.
A decisão reafirma que:
- A denúncia anônima, por si só, não autoriza a entrada em domicílio;
- É necessário que a autoridade policial comprove, posteriormente, a existência de indícios objetivos de crime em curso;
- A ausência de mandado judicial só é suprida quando há flagrante delito devidamente justificado.
A jurisprudência do STJ tem sido rigorosa quanto à necessidade de motivação concreta e posterior controle judicial da legalidade da medida. A violação de domicílio sem justificativa idônea pode acarretar a nulidade da prova e, por consequência, a absolvição do réu.
Esse entendimento reforça a proteção constitucional à inviolabilidade do domicílio (art. 5º, XI, da CF), sem comprometer a eficácia da persecução penal, desde que respeitados os limites legais e jurisprudenciais.
⛓️ Execução Penal e Posse de Entorpecente: Falta Grave e Remição
A posse de entorpecente no interior de estabelecimento prisional, ainda que em pequena quantidade, tem sido reconhecida pelo STJ como falta grave, com repercussões diretas na execução penal, especialmente na perda de dias remidos. A jurisprudência da Corte tem reafirmado que a aplicação do Tema 506/STF não se estende automaticamente ao ambiente carcerário.
No AgRg no HC 921374/SP, DJEN 08/04/2025, o STJ analisou a legalidade da perda de 1/3 dos dias remidos de um apenado flagrado com 19g de maconha. A defesa alegava quebra da cadeia de custódia e invocava a tese do STF sobre a presunção de uso pessoal. A Corte, no entanto, afastou ambas as alegações. Entendeu que não houve demonstração concreta de violação da cadeia de custódia e que a tese do Tema 506 não havia sido debatida nas instâncias anteriores, configurando inovação recursal.
Além disso, o STJ reafirmou que a posse de droga no cárcere, mesmo em quantidade inferior a 40g, pode configurar falta grave, desde que a decisão esteja devidamente fundamentada na gravidade concreta da conduta e no histórico do apenado. A perda de dias remidos, nesses casos, pode alcançar até 1/3, conforme o art. 57 da Lei de Execução Penal.
Esse entendimento reforça a autonomia do juízo da execução penal na análise da disciplina carcerária, sem prejuízo da aplicação de garantias constitucionais. A jurisprudência tem buscado um ponto de equilíbrio entre a proteção dos direitos dos presos e a preservação da ordem e segurança no sistema penitenciário.
🔁 A Retroatividade da Tese do STF: Limites e Competência do Juízo da Execução
A tese firmada pelo STF no Tema 506, que reconhece a atipicidade penal da posse de cannabis sativa para uso pessoal, levanta uma questão delicada: ela pode ser aplicada retroativamente para beneficiar condenados definitivos? A resposta do STJ tem sido negativa, especialmente no âmbito da execução penal.
No Acórdão 2002653 do TJDFT (0710632-04.2025.8.07.0000, Rel. ESDRAS NEVES, DJE 02/06/2025), ficou claro que, embora o artigo 5º, XL, da Constituição Federal assegure a retroatividade da lei penal mais benéfica, esse princípio não se aplica automaticamente a precedentes jurisprudenciais. O entendimento foi reforçado com base no julgamento do STF no ARE 1.317.169 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, que afastou a obrigatoriedade da retroatividade de precedentes, salvo modulação expressa.
Além disso, o STJ tem afirmado que o juízo da execução penal não possui competência para aplicar retroativamente teses jurisprudenciais, mesmo que firmadas sob a sistemática de repercussão geral ou recursos repetitivos. Essa atribuição cabe ao juízo da condenação, que detém a competência para reavaliar o mérito da imputação penal com base em novas interpretações.
Portanto, a aplicação retroativa do Tema 506 exige provocação específica no juízo competente, com análise individualizada do caso concreto. A simples existência do precedente não autoriza, por si só, a revisão automática de condenações transitadas em julgado.
🧭 Desafios Práticos e Perspectivas Legislativas sobre o Porte de Cannabis
A consolidação da tese do Tema 506/STF representou um divisor de águas na interpretação do artigo 28 da Lei de Drogas. No entanto, sua aplicação prática tem gerado desafios significativos para o sistema de justiça criminal, especialmente diante da ausência de regulamentação legislativa clara sobre os critérios objetivos para diferenciar usuário de traficante.
O STJ tem buscado suprir essa lacuna com parâmetros jurisprudenciais, como demonstrado no AgRg no HC 961071/SP (DJEN 26/02/2025), que reafirma a presunção de uso pessoal para até 40g de maconha, desde que ausentes indícios de mercancia. Contudo, a relatividade dessa presunção tem gerado insegurança jurídica, pois a análise depende fortemente da interpretação subjetiva de juízes e autoridades policiais.
Outro ponto crítico é a ausência de modulação dos efeitos da decisão do STF, o que impede sua aplicação retroativa automática, conforme decidido no Acórdão 2002653 do TJDFT (DJE 02/06/2025). Isso cria um cenário de desigualdade entre réus em situações semelhantes, dependendo apenas da fase processual em que se encontram.
Além disso, a falta de regulamentação específica sobre o procedimento a ser adotado pelas autoridades policiais e pelo Judiciário — como previsto no item 3 da tese do STF — tem dificultado a uniformização das práticas. A competência provisória dos Juizados Especiais Criminais, por exemplo, ainda carece de diretrizes claras do CNJ.
Diante disso, cresce a pressão por uma atuação mais célere do Congresso Nacional, seja para regulamentar os critérios objetivos de distinção entre uso e tráfico, seja para discutir a descriminalização ou legalização do porte de cannabis. Até lá, o Judiciário continuará sendo o principal protagonista na definição dos limites dessa controvérsia.
Referências:
- Tema 506 do STF - Porte de droga para consumo pessoal – atipicidade. TJDFT, 2025. Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/precedentes-qualificados-na-visao-do-tjdft/direito-penal/porte-de-droga-para-consumo-pessoal/tema-506-do-stf-tipicidade-do-porte-de-droga-para-consumo-pessoal. Acesso em: 07 jul. 2025.