Para as ações que buscam o ressarcimento ao Sistema Único de Saúde (SUS), conforme o art. 32 da Lei n. 9.656/1998, o prazo prescricional aplicável é de cinco anos. Esse prazo está previsto no Decreto n. 20.910/1932. O termo inicial para a contagem desse prazo é a data da notificação da decisão administrativa que apurou os valores a serem ressarcidos.
Essa tese foi fixada pela 1ª Seção do STJ no REsp 1.978.141-SP e REsp 1.978.155-SP, de relatoria do Ministro Afrânio Vilela, julgados em 14/05/2025, sob o rito de Recurso Repetitivo (Tema 1147).
Aprofundando:
Entenda o Ressarcimento ao SUS
O art. 32 da Lei nº 9.656/98 estabelece que, se um beneficiário de plano de saúde utilizar os serviços do SUS, o Poder Público pode cobrar da operadora do plano o ressarcimento das despesas incorridas. Essa é uma obrigação legal das operadoras de planos privados de assistência à saúde.
Na prática, o processo ocorre da seguinte forma:
- O paciente é atendido em uma instituição pública ou privada, conveniada ou contratada, que integra o SUS.
- A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) cruza dados dos sistemas do SUS com seu Sistema de Informações de Beneficiários (SIB) para identificar quem foi atendido na rede pública e possui plano de saúde.
- A ANS notifica a operadora de saúde sobre os atendimentos de seus clientes.
- A operadora pode contestar administrativamente, alegando, por exemplo, que o serviço não era coberto pelo plano ou que o paciente não era mais usuário.
- Se não houver contestação ou se esta não for acolhida, a ANS cobra os valores devidos.
- Em caso de não pagamento, a operadora é incluída no CADIN e os débitos são inscritos em dívida ativa da ANS para posterior execução.
- Os valores arrecadados são repassados pela ANS ao Fundo Nacional de Saúde.
Constitucionalidade do Ressarcimento ao SUS
O Supremo Tribunal Federal (STF) já firmou entendimento de que o ressarcimento previsto no art. 32 da Lei nº 9.656/98 é constitucional. Ele é aplicável a procedimentos médicos, hospitalares ou ambulatoriais custeados pelo SUS após 04/06/1998, desde que assegurados o contraditório e a ampla defesa no âmbito administrativo. Essa decisão foi proferida pelo Plenário do STF no RE 597064/RJ, sob Repercussão Geral (Tema 345), em 07/02/2018.
Situação Hipotética e Análise da Prescrição
Imagine que Regina, beneficiária de um plano da Unimed, foi atendida pelo SUS em março de 2018 após um acidente de trânsito. Em 2020, a ANS identificou o atendimento e iniciou um processo administrativo para apurar o ressarcimento. Em dezembro de 2020, a ANS notificou a Unimed, cobrando R$ 45.000,00. Como não houve pagamento, a ANS inscreveu o valor em dívida ativa e, em abril de 2020, iniciou a execução fiscal.
A Unimed argumentou que o ressarcimento teria natureza indenizatória, sujeita ao prazo prescricional de 3 anos do art. 206, § 3º, V, do Código Civil. Alegou que o prazo deveria contar de março de 2018 (data do atendimento), e que a execução iniciada em abril de 2020 já estaria prescrita.
A ANS, por sua vez, defendeu que a relação é administrativa, aplicando-se o prazo de 5 anos do Decreto 20.910/32. Para a ANS, a contagem só começaria a partir da notificação da decisão administrativa (dezembro de 2020), o que afastaria a prescrição.
Decisão do STJ
O STJ acolheu os argumentos da ANS. A Corte entende que a obrigação de ressarcir o SUS, regulamentada pela Lei nº 9.656/1998 e com apuração administrativa e inscrição em dívida ativa, é regida pelo Direito Administrativo. Assim, afasta-se a aplicação do Código Civil.
A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que, em demandas de ressarcimento ao SUS, incide o prazo prescricional quinquenal do Decreto 20.910/1932, em observância ao princípio da isonomia.
Além disso, o STJ pacificou que o termo inicial do prazo prescricional só começa após a notificação da cobrança feita pela ANS, conforme o art. 32, § 3º, da Lei 9.656/1998.
A tese fixada pelo STJ foi: "Nas ações com pedido de ressarcimento ao Sistema Único de Saúde de que trata o art. 32 da Lei n. 9.656/1998, é aplicável o prazo prescricional de cinco anos previsto no Decreto n. 20.910/1932, contado a partir da notificação da decisão administrativa que apurou os valores.".
Revisão em Perguntas e Respostas
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Qual é o prazo prescricional aplicável ao ressarcimento ao SUS previsto no art. 32 da Lei 9.656/1998? O prazo prescricional aplicável é de cinco anos, conforme estabelecido no art. 1º do Decreto 20.910/1932. O STJ afastou o prazo trienal do Código Civil, pois a relação entre a ANS e as operadoras de planos de saúde é regida pelo Direito Administrativo.
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Qual é o termo inicial para contagem do prazo prescricional no ressarcimento ao SUS? O termo inicial do prazo prescricional é a notificação da decisão administrativa que apurou os valores a serem ressarcidos. O STJ rejeitou que o prazo começasse da internação ou alta do paciente, pois o crédito se torna exigível apenas com a notificação da cobrança da ANS.
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Por que não se aplica o Código Civil ao prazo prescricional do ressarcimento ao SUS? A relação jurídica entre a ANS e as operadoras de planos de saúde é de Direito Administrativo, e não de direito privado. O ressarcimento decorre de previsão legal expressa, envolve apuração administrativa e inscrição em dívida ativa, o que afasta a aplicação do Código Civil.
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Qual o fundamento para aplicação do princípio da isonomia no ressarcimento ao SUS? O STJ aplicou o princípio da isonomia para garantir tratamento igualitário entre administrados e a Administração Pública. Assim como a Fazenda Pública está sujeita ao prazo quinquenal quando demandada em ações indenizatórias (Decreto 20.910/1932), por simetria, o mesmo prazo deve incidir quando ela figura como autora em demandas de ressarcimento.
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O que caracteriza a natureza jurídica do ressarcimento previsto no art. 32 da Lei 9.656/1998? O ressarcimento possui natureza indenizatória e compensatória, constituindo crédito não tributário da Fazenda Pública. Trata-se de receita originária, com o objetivo de evitar o enriquecimento sem causa das operadoras às custas do serviço público de saúde.
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Qual é o procedimento legal para efetivação do ressarcimento ao SUS? O art. 32 da Lei 9.656/1998 estabelece que a ANS define o procedimento de apuração dos valores. A ANS discrimina os procedimentos realizados e expede a notificação de cobrança. A operadora tem 15 dias úteis para ressarcir. Se não houver pagamento, os valores são inscritos em dívida ativa da ANS, que promove a cobrança judicial.
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Como funciona a constituição do crédito no ressarcimento ao SUS? O crédito do ressarcimento ao SUS carece de constituição definitiva durante o procedimento administrativo. Somente após o encerramento do processo administrativo e a notificação de cobrança é que o crédito se torna líquido, certo e exigível. Por isso, o prazo prescricional só começa após essa notificação.
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Por que não ocorre prescrição durante a fase administrativa do ressarcimento? Durante a fase administrativa não há prescrição porque o crédito ainda não está definitivamente constituído. O prazo prescricional quinquenal só se inicia após o encerramento do processo administrativo e a notificação da cobrança, que é o momento em que o débito se torna líquido e certo. Enquanto o processo administrativo tramita, não se fala em prescrição da pretensão de cobrança.
Fonte: Dizer o Direito