Multa de Mora em Débitos Federais: O STJ e a Base de Cálculo sobre o Valor Originário

Para os créditos de qualquer natureza das autarquias e fundações públicas federais, não pagos nos prazos previstos na legislação, a multa de mora deve ser calculada apenas sobre o débito, assim compreendido o valor histórico sem acréscimo de quaisquer encargos, sendo inadequado atualizar o respectivo montante pela Taxa Selic para, só então, aferir-se a penalidade moratória.

STJ. 1ª Turma. REsp 2.126.210-CE, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 6/5/2025 (Informativo 850 do STJ).

1. A Multa de Mora e a Cobrança de Créditos por Entidades Federais

A cobrança de créditos pela Administração Pública Federal, especialmente por autarquias e fundações públicas, é um tema de constante relevância no Direito Tributário e Administrativo. Quando um débito não é pago nos prazos legalmente estabelecidos, há a incidência de encargos moratórios, entre eles a multa de mora. A forma como essa penalidade é calculada possui diretrizes específicas para evitar onerosidade excessiva e garantir a legalidade da cobrança.

Conforme o Art. 37-A da Lei n. 10.522/2002, os créditos de qualquer natureza das autarquias e fundações públicas federais, quando não pagos em tempo hábil, serão acrescidos de juros e multa de mora, conforme a legislação aplicável aos tributos federais. Isso significa que a metodologia de cálculo segue as normas já estabelecidas para os débitos tributários federais.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem consolidado o entendimento de que a base de cálculo da multa de mora corresponde ao valor do débito originário, ou seja, o valor histórico, sem a inclusão de quaisquer outros encargos moratórios. Para tanto, o STJ fundamenta-se no Art. 61 da Lei nº 9.430/1996 e no Art. 3º do Decreto-Lei n. 1.736/1979. Este último dispositivo, inclusive, define "valor originário" como o débito sem as parcelas relativas à correção monetária, juros de mora e a própria multa de mora.

Portanto, não é permitido atualizar previamente esse montante pela Taxa Selic antes do cálculo da penalidade. A lógica por trás dessa vedação é clara: aplicar a multa sobre um valor já corrigido implicaria em uma cobrança indevida, gerando um acréscimo excessivo e a ocorrência de bis in idem, o que a legislação busca evitar.

2. O Entendimento do STJ: Débito Originário como Base de Cálculo

A questão da base de cálculo da multa de mora, especialmente em débitos federais, tem sido objeto de pacificação na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O Tribunal firmou o entendimento de que a multa de mora deve incidir exclusivamente sobre o valor do débito originário, sem qualquer inclusão prévia de outros encargos moratórios, como juros ou correção monetária pela Taxa Selic.

Este posicionamento é fundamentado em dispositivos legais específicos:

  • O Art. 37-A da Lei n. 10.522/2002 estabelece que os créditos de autarquias e fundações públicas federais, quando não pagos em prazo, serão acrescidos de juros e multa de mora conforme a legislação aplicável aos tributos federais.
  • O Art. 61 da Lei nº 9.430/1996 disciplina o cálculo dos juros e da multa de mora incidentes sobre os tributos federais, prevendo a multa à razão de 0,33% ao dia, limitada a 20%, e a incidência de juros de mora calculados pela Taxa Selic.
  • O Art. 3º do Decreto-Lei n. 1.736/1979 define claramente o "valor originário" como o débito sem as parcelas relativas à correção monetária, juros de mora e a própria multa de mora.

A interpretação conjunta desses dispositivos leva à conclusão de que o termo "débito", utilizado como base de cálculo da multa moratória, refere-se ao valor histórico do montante devido.

Isso significa que a autarquia ou fundação pública federal não pode, por exemplo, primeiro atualizar o valor principal do débito pela Taxa Selic e, em seguida, aplicar a multa de mora sobre esse montante já corrigido. Essa metodologia é considerada inadequada pelo STJ. Conforme um caso hipotético analisado, em que a ANS atualizou um débito de R$ 100.000,00 para R$ 150.000,00 pela Taxa Selic e só então aplicou a multa de 20% sobre R$ 150.000,00, resultando em R$ 30.000,00 de multa, o STJ considerou essa metodologia incorreta.

A decisão do STJ visa a prevenir a ocorrência de bis in idem, ou seja, a dupla cobrança sobre o mesmo fator gerador. Se a multa de mora fosse aplicada sobre um valor já corrigido pela Selic (que já contém juros e correção monetária), isso resultaria em uma cobrança excessiva e indevida de "juros sobre multa" ou "multa sobre juros", o que é vedado pela norma. Além disso, a multa de mora possui um teto de 20% previsto no Art. 61, § 2º, da Lei n. 9.430/1996, e o acréscimo prévio de juros ao valor histórico do débito poderia levar a um montante sancionatório superior a esse limite legal.

Portanto, a base de cálculo da multa de mora deve ser o valor puro do débito, garantindo que a penalidade recaia apenas sobre o montante principal devido antes da incidência de qualquer outro encargo moratório.

3. Consequências e a Vedação do Bis in Idem

O posicionamento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que a multa de mora deve incidir sobre o valor originário do débito, sem prévia atualização pela Taxa Selic, acarreta importantes consequências práticas e reafirma um princípio fundamental do direito sancionatório: a vedação do bis in idem.

A principal implicação dessa metodologia de cálculo é a prevenção de uma cobrança excessiva e indevida. Se a multa de mora fosse aplicada sobre um valor já corrigido pela Taxa Selic – que por si só já compreende juros e correção monetária – haveria uma dupla penalização pelo mesmo fato gerador: o atraso no pagamento. Isso resultaria na cobrança de "juros sobre multa" ou "multa sobre juros", o que é expressamente vedado e representa um aumento desproporcional do encargo.

A decisão do STJ, fundamentada no Art. 61 da Lei nº 9.430/1996 e no Art. 3º do Decreto-Lei n. 1.736/1979, estabelece que "valor originário" é o débito sem as parcelas relativas à correção monetária, juros de mora e a própria multa de mora. Isso assegura que a penalidade recaia apenas sobre o valor principal devido, antes de qualquer outro acréscimo moratório.

Além disso, a multa de mora possui um teto legal de 20%. A aplicação da multa sobre um valor já atualizado pela Selic poderia levar a um montante sancionatório que excederia esse limite legal, desvirtuando a finalidade da penalidade e onerando indevidamente o devedor.

Em resumo, a metodologia correta impõe que, para os créditos das autarquias e fundações públicas federais, a multa de mora seja calculada apenas sobre o débito histórico, sem a inclusão de quaisquer outros encargos. É inadequado atualizar previamente o montante pela Taxa Selic para só então aferir a penalidade moratória. Essa clareza na definição da base de cálculo garante a segurança jurídica, a previsibilidade e impede a ocorrência de bis in idem na cobrança de débitos federais.

Avatar de diego
há 4 semanas
Matéria: Direito Tributário
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