Retenção Dolosa de Salário: STF Reconhece Omissão do Congresso e Fixa Prazo para Criminalização

O Congresso Nacional está em mora na edição da lei regulamentadora referente à tipificação penal da retenção dolosa do salário dos trabalhadores urbanos e rurais (art. 7º, X, CF/88).

STF. Plenário. ADO 82/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/05/2025 (Informativo 1179 do STF)

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O Mandado Constitucional de Criminalização Previsto no Art. 7º, X

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7º, inciso X, estabelece como um dos direitos fundamentais dos trabalhadores a "proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa". Este dispositivo não representa uma mera recomendação, mas sim um mandado constitucional de criminalização com natureza vinculante.

Isso significa que a Constituição impõe ao legislador ordinário, de forma obrigatória, o dever de criar uma lei específica que tipifique como crime a conduta do empregador que, intencionalmente, deixa de pagar o salário devido ao trabalhador. A finalidade é assegurar a máxima proteção a uma verba de caráter alimentar, essencial para a subsistência do trabalhador e de sua família. A inobservância desse comando pelo Congresso Nacional, portanto, não é uma opção política, mas uma falha em cumprir uma determinação constitucional expressa, o que caracteriza uma omissão inconstitucional.


A Omissão Inconstitucional e a Mora Legislativa do Congresso

A inobservância do mandado de criminalização por parte do legislador caracteriza uma omissão inconstitucional. O Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou o entendimento de que, diante do extenso lapso temporal decorrido desde a promulgação da Constituição de 1988 sem a criação da referida lei, o Congresso Nacional se encontra em mora legislativa.

O tribunal destacou que a mera existência de projetos de lei tramitando no Congresso sobre o tema não é suficiente para afastar o reconhecimento dessa mora. A demora excessiva e injustificada em regulamentar um direito fundamental dos trabalhadores, que depende de legislação específica para sua plena eficácia, configura uma falha do Poder Legislativo em cumprir com suas obrigações constitucionais. Dessa forma, a inércia parlamentar foi formalmente reconhecida como uma violação à ordem constitucional, abrindo caminho para a intervenção do Judiciário a fim de sanar a omissão.


Insuficiência do Crime de Apropriação Indébita para a Retenção Salarial

Durante os debates sobre a omissão legislativa, um dos argumentos levantados era que a conduta de reter dolosamente o salário já poderia ser enquadrada no crime de apropriação indébita, previsto no artigo 168 do Código Penal. Contudo, o Supremo Tribunal Federal rechaçou essa tese.

Segundo o entendimento da Corte, o tipo penal da apropriação indébita não contempla adequadamente as especificidades e a gravidade da retenção dolosa do salário do trabalhador. A Constituição, ao prever expressamente a criminalização da conduta, determinou a criação de uma tipificação específica, que valorasse o bem jurídico tutelado — o salário — de forma particular e mais protetiva. A conduta de não pagar o salário deliberadamente ofende diretamente a dignidade do trabalhador e sua subsistência, exigindo, por essa razão, uma norma penal própria e autônoma, conforme o mandado de criminalização do art. 7º, X.


A Decisão do STF na ADO 82 e o Prazo para Legislar

Diante do cenário de inércia prolongada, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 82/DF, declarou formalmente que o Congresso Nacional está em mora para editar a lei que criminaliza a retenção dolosa de salário, conforme exigido pelo art. 7º, X, da Constituição.

Em uma decisão de grande impacto para os direitos sociais, a Corte não se limitou a reconhecer a omissão. O STF foi além e fixou um prazo de 180 dias para que o Poder Legislativo sane a falha e aprove a legislação necessária. A medida representa uma atuação enérgica do Judiciário para garantir a efetividade de uma norma constitucional de proteção ao trabalhador, estabelecendo uma consequência concreta para a inércia legislativa.

A decisão foi proferida pelo Plenário do STF na ADO 82/DF, com relatoria do Ministro Dias Toffoli, em julgamento de 26 de maio de 2025.

Referências:

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há 1 semana
Matéria: Direito Constitucional
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