Disposições Gerais
O Regime Jurídico Único para os servidores públicos da administração direta, autárquica e fundacional consta na Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Trata-se de uma Lei Federal e, portanto, aplica-se exclusivamente à União. Dessa forma, os estados e municípios devem possuir leis próprias estabelecendo o regramento para os seus servidores públicos.
Além disso, as regras da Lei 8.112/1990 só alcançam os órgãos da administração direta, das autarquias e das fundações públicas, não se aplicando às empresas públicas e às sociedades de economia mista, cujos empregados públicos submetem-se às regras da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.
Nesse contexto, acrescenta-se que a Lei 8.112/1990 é o Estatuto dos servidores públicos, em sentido estrito. São os chamados servidores estatutários, justamente porque sua relação profissional se dá por meio das regras previstas em um “estatuto” que, no caso, é a Lei 8.112/1990. Assim, tal diploma legal costuma ser chamado de Estatuto dos Servidores Públicos da União.
Natureza do vínculo
- O vínculo dos empregados públicos é contratual, e só pode ser alterado por concordância das duas partes (empregado e poder público).
- A relação entre os servidores públicos estatutários e o poder público é legal, podendo ser alterada sempre que o estatuto sofrer modificações.
- O servidor público não está livre de modificações legais, que podem alterar os termos de sua relação com a Administração Pública.
Jurisprudência
O STF e o STJ já reconheceram que o servidor público não possui direito adquirido à imutabilidade do regime jurídico. Como toda lei é passível de modificação, é possível a alteração legal do regime jurídico inicial de um servidor público.
Por exemplo, no MS 28.433 Agr/PB, o Supremo Tribunal Federal entendeu que:
“O servidor público não tem direito adquirido a regime jurídico, o que, consequentemente, significa que não há violação a direito quando se altera a jornada de trabalho anteriormente fixada.”
Nota de jurisprudência: No STF, ver MS 28.433 AgR/DF; no mesmo sentido, podemos observar o EDcl no AgR no RESp 1.349.802/RJ, nos seguintes termos:
“Ocorre que a natureza do vínculo que liga o servidor ao Estado é de caráter legal e pode, por conseguinte, sofrer modificações no âmbito da legislação ordinária pertinente, as quais o servidor deve obedecer, de modo que não há direito adquirido do servidor a determinado regime jurídico, nos termos de tranquila jurisprudência da Suprema Corte.”
Limites das modificações legais
Entretanto, as modificações em lei não poderão retirar aquilo que o servidor já alcançou a título de direito adquirido, ou seja, os direitos dos quais ele já tenha preenchido os requisitos para gozá-los devem ser respeitados.
Conceitos Fundamentais da Lei 8.112/1990
Definições legais
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Servidor público: Pessoa legalmente investida em cargo público (art. 2º).
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Cargo público: Conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor (art. 3º, caput).
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Os cargos públicos são:
- Acessíveis a todos os brasileiros.
- Criados por lei.
- Possuem denominação própria.
- Têm vencimento pago pelos cofres públicos.
- Destinam-se ao provimento em caráter efetivo ou em comissão (art. 3º, parágrafo único).
Natureza do cargo público
O cargo público é uma unidade de competência atribuída a um servidor público, criada por lei e prevista em número certo, com denominação própria.
Exemplos de cargos públicos:
- Auditor Federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União
- Analista Tributário da Receita Federal do Brasil
- Analista Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral
Tipos de provimento
- Efetivo: Depende de prévia aprovação em concurso público.
- Comissionado: De livre nomeação e exoneração pela autoridade competente.
Ambos os tipos de servidores — concursados e comissionados — submetem-se ao Regime Estatutário.
Servidor público é o ocupante de cargo público, podendo ser de provimento efetivo ou em comissão.
Proibição de serviços gratuitos
De acordo com o art. 4º da Lei 8.112/1990, os servidores públicos desenvolvem suas atividades como profissão. Por esse motivo, é vedada a prestação de serviços gratuitos, salvo os casos previstos em lei.
Concurso Público
Finalidade do concurso
O concurso público possui dupla finalidade:
- Selecionar os melhores candidatos para o preenchimento da vaga, conforme o nível de conhecimento demonstrado na avaliação.
- Garantir igualdade de oportunidade, permitindo que todas as pessoas que atendem aos requisitos do cargo possam concorrer à vaga.
Modalidades e etapas
- O concurso poderá ser:
- De provas
- De provas e títulos
- Pode ser realizado em duas etapas, conforme disposto em lei ou regulamento do plano de carreira.
Inscrição
- A inscrição será condicionada ao pagamento do valor fixado no edital, quando indispensável ao seu custeio.
- Exceções: hipóteses de isenção previstas expressamente no edital (art. 11).
Prazo de validade
- O prazo de validade do concurso público será de até dois anos, podendo ser prorrogado uma única vez, por igual período (art. 12).
- Portanto, o prazo máximo é de quatro anos.
- A prorrogação deve ser idêntica ao período inicial. Exemplo: validade de 90 dias → prorrogação de mais 90 dias.
Publicação e novo concurso
- As condições de realização e o prazo de validade devem ser fixados em edital, publicado:
- No Diário Oficial da União
- Em jornal diário de grande circulação (art. 12, §1º)
Art. 12, §2º: Não se abrirá novo concurso enquanto houver candidato aprovado em concurso anterior com prazo de validade não expirado.
Provimento
Requisitos básicos para investidura em cargo público (art. 5º)
De acordo com a Lei 8.112/1990, são requisitos básicos:
- a) Nacionalidade brasileira
- b) Gozo dos direitos políticos
- c) Quitação com as obrigações militares e eleitorais
- d) Nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo
- e) Idade mínima de dezoito anos
- f) Aptidão física e mental
Além disso, as atribuições do cargo poderão justificar a exigência de outros requisitos estabelecidos em lei (art. 5º, §1º).
Legalidade das exigências
- Os concursos públicos devem permitir a maior competição possível, exigindo apenas requisitos essenciais para o desempenho das atribuições do cargo.
- Exigências diferenciadas devem estar previstas em lei, não podendo ser criadas por atos infralegais: Atos administrativos não podem estabelecer restrições.
Jurisprudência relevante
Súmula 14 do STF: “Não é admissível, por ato administrativo, restringir, em razão da idade, inscrição em concurso para cargo público.”
Súmula Vinculante 44 do STF: “Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.”
Exemplos de exigências indevidas
- Se o cargo exige curso superior sem especificar área de formação, não pode o edital restringir o acesso apenas aos formados em direito.
- Limitações de idade ou altura também devem estar amparadas em lei, não podendo constar apenas no edital.
Ingresso de estrangeiros
- A Emenda Constitucional 19/1998 modificou o inciso I do art. 37 da CF, permitindo o ingresso de estrangeiros, na forma da lei.
- Trata-se de norma de eficácia limitada, pois depende de regulamentação legal.
Aplicação específica
- Conforme o §3º do art. 5º da Lei 8.112/1990, universidades e instituições de pesquisa científica e tecnológica federais podem prover seus cargos com:
- Professores
- Técnicos
- Cientistas estrangeiros
Obedecendo às normas e procedimentos do Estatuto dos Servidores.
Inclusão de pessoas com deficiência
- A Lei 8.112/1990 assegura às pessoas com deficiência o direito de se inscrever em concurso público para cargos compatíveis com sua condição.
- Devem ser reservadas até 20% das vagas oferecidas no concurso para pessoas com necessidades especiais.
Provimento e posse
Art. 6º: O provimento dos cargos públicos será feito mediante ato da autoridade competente de cada Poder.
Art. 7º: A investidura em cargo público ocorre com a posse.
Formas de Provimento
Segundo Hely Lopes Meirelles, provimento é o ato pelo qual se efetua o preenchimento do cargo público, com a designação de seu titular.
A Lei 8.112/1990 estabelece sete hipóteses de provimento:
- a) Nomeação
- b) Promoção
- c) Readaptação
- d) Reversão
- e) Aproveitamento
- f) Reintegração
- g) Recondução
Provimento Originário
- Realizado por meio da nomeação
- Preenchimento inicial do cargo, sem vínculo anterior com a Administração
- Para cargos efetivos, depende de aprovação prévia em concurso público
- Única forma de provimento originário
Provimento Derivado
- Pressupõe vínculo anterior com a Administração
- Modifica a situação funcional do servidor já vinculado ao poder público
Formas derivadas previstas na Lei 8.112/1990:
- Promoção
- Readaptação
- Reversão
- Aproveitamento
- Reintegração
- Recondução
Inconstitucionalidade de certas formas
Na redação original da Lei 8.112/1990, constavam também:
Essas formas foram revogadas pela Lei 9.527/1997, por serem consideradas inconstitucionais pelo STF.
Súmula Vinculante 43 do STF: “É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.”
A redação da súmula deve ser analisada com ressalvas, pois a própria Constituição admite provimento em cargo distinto em alguns casos.
Também consideradas inconstitucionais:
- Transposição
- Transformação
- Ascensão funcional
Previsão constitucional
As seguintes formas de provimento derivado possuem previsão expressa na Constituição Federal (art. 41, §§2º e 3º):
- Reintegração
- Aproveitamento
- Recondução
Aproveitamento
- Permite o reingresso do servidor em carreira distinta
- Ocorre quando um servidor é reintegrado e o ocupante atual do cargo precisa ser reconduzido ou aproveitado em outro cargo
- O cargo de aproveitamento deve ter atribuições e vencimentos semelhantes ao anterior (Lei 8.112/1990, art. 30)
Readaptação
- Aplicável quando o servidor sofre limitação física ou mental
- O servidor é investido em cargo compatível com sua limitação
- Embora ocorra em cargo distinto, não foi declarada inconstitucional pelo STF
O que se quer **vedar são formas injustificadas de provimento em cargo distinto, como a ascensão sem concurso.
Resumo das formas de provimento:
- Originário: Nomeação
- Derivado:
- Promoção
- Readaptação
- Reversão
- Aproveitamento
- Reintegração
- Recondução
Classificação segundo Celso Antônio Bandeira de Mello
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Vertical (Promoção): O servidor é elevado a cargo mais alto dentro da mesma carreira.
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Horizontal (Readaptação): O servidor muda para cargo compatível com limitação física ou mental, sem ascender ou rebaixar.
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Por Reingresso (Reversão, Aproveitamento, Reintegração, Recondução): O servidor retorna ao serviço ativo após desligamento.